Como identificar fake news de saúde

Você abre as redes sociais e vê conteúdos que parecem promissores: uma nova dieta, um remédio milagroso, um chip que vai melhorar sua aparência. Ou até mesmo notícias que preocupam sobre efeitos colaterais e riscos de alguma vacina. Esse tipo de conteúdo viraliza fácil e engaja o público, mas nem sempre está ligado a alguma evidência científica.
Em meio a tantos alarmes infundados, o interesse por informações confiáveis nunca foi tão necessário. Mais da metade dos brasileiros se diz interessada ou muito interessada por temas de ciência e tecnologia, segundo a sexta edição da pesquisa “Percepção Pública da C&T no Brasil”, de 2023, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE).
O estudo apontou ainda que parte dos brasileiros (39,8%) frequentemente procura por informações sobre ciência e tecnologia nas redes sociais, aplicativos de mensagens e plataformas digitais. Porém, nas redes também circula a desinformação: 5 a cada 10 dos participantes relatam se deparar frequentemente com notícias que parecem falsas (50,8%), segundo a pesquisa.
“Essa pesquisa mostra que o brasileiro gosta e acompanha ciência, mas nós como população (leiga) não temos as ferramentas e o conhecimento para entender todo e qualquer conteúdo científico”, explica a professora do Instituto de Biologia da Unicamp e coordenadora do projeto de Divulgação Científica “Blogs de Ciência” da universidade, Ana de Medeiros Arnt.
Vários fatores podem estar por trás da rápida disseminação de notícias falsas sobre saúde, como explica Izamara Bastos Machado, jornalista e professora do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde, da Fiocruz: “os temas vinculados à saúde estão entre os conteúdos que capturam muito a atenção, seja porque queremos estar atualizados sobre o tema, seja porque tememos por situações que podem fragilizar nossas próprias condições de saúde”.
Outro aspecto que pode contribuir é a busca por uma saída que satisfaça o leitor. “A ciência nos dá respostas com evidências, mas nem sempre é a resposta que a gente quer. A resposta da charlatania, às vezes, é muito mais acolhedora”, complementa Izamara Machado. Para a professora, o acesso à informação segura e de qualidade é um direito de todo cidadão.
A seguir, confira alguns sinais para identificar notícias de saúde falsas, segundo as especialistas ouvidas pela IstoÉ.
O primeiro ponto de atenção é desconfiar de curas e tratamentos milagrosos: “se alguém está oferecendo uma cura rápida e simples para algo que muitas pessoas sofrem, tem algo estranho. A ciência não trabalha com milagres, e sim com análises e correlações de alta complexidade”, explica Ana de Medeiros Arnt, da Unicamp.
O alerta vale especialmente para soluções oferecidas de forma exclusiva. “Esse é um clássico da desinformação: uma verdade que só uma pessoa sabe, uma cura do dia para a noite… A ciência é uma ação coletiva, feita por muitas pessoas e, muitas vezes, (a solução) vai ser demorada mesmo”, acrescenta a professora do Instituto de Biologia da Unicamp.
Uma opção para verificar a veracidade da informação aqui é se certificar de que o conteúdo está sendo compartilhado e debatido por outros veículos confiáveis e perfis de instituições nacionalmente conhecidas.
Ao ver um conteúdo, questione se quem está publicando teria algum interesse político ou financeiro por trás da postagem, como é o caso de postagens ligadas à comercialização de medicamentos, por exemplo, conforme pontua Ana Arnt: “Desconfie quando a verdade de algum especialista ou médico está atrelado à venda de um produto que só ele sabe qual é. Principalmente tratando de saúde, isso é um conflito de interesses”.
Os principais riscos nesses casos são medicamentos sem legitimidade ou validação no meio científico e prescrição sem acompanhamento médico. Além disso, há riscos financeiros, lembra Izamara Machado: “é importante pensar na quantidade de pessoas que investem suas economias em situações que prometem curas para suas questões de saúde-doença”.
Conteúdos falsos podem apresentar características difíceis de identificar, especialmente nas redes sociais, onde o conteúdo costuma estar aliado aos interesses do usuário. “Não podemos esquecer que as desinformações nas redes sociais vão apelar para nossas emoções e vulnerabilidades identificadas pelos algoritmos, que mediam e orientam aquilo que cada um irá ver. Desse modo, as informações falsas vão nos envolver emocionalmente e vão buscar conexões com nossas crenças e estilos de vida – aumentando, e muito, o desafio de identificarmos se o conteúdo científico é falso ou verdadeiro”, explica Izamara Machado, da Fiocruz.
Nesses casos, é ainda mais relevante checar as fontes da informação, pesquisando se a informação está ligada a alguma universidade, instituições científicas e revistas renomadas, como JAMA, Nature, Science, The Lancet, entre outras.
Outra dica importante é conferir se há consistência no conteúdo apresentado, detalhamento dos dados e informações dos responsáveis pelo estudo, assim como sobre o contexto e o período em que foi realizado.
Nem todo conteúdo é completamente falso, às vezes ele foi tirado de contexto, mal interpretado ou manipulado. No geral, a dica das especialistas é clara: se algum conteúdo mobiliza você de alguma maneira, desconfie e confira antes de compartilhar.
Nem toda a responsabilidade deve ficar na mão do cidadão, entretanto. “Essa discussão é coletiva e tem de envolver políticas públicas que responsabilizem as plataformas pelos conteúdos que circulam ali”, finaliza a pesquisadora e bióloga Ana Arnt, que defende a regulação das redes.
IstoÉ