Álcool pode causar ansiedade no dia seguinte?

Se você está no grupo dos que bebem para relaxar ou descontrair, principalmente em eventos sociais, saiba que o resultado pode ser o contrário. Cada vez mais pesquisas comprovam que, além dos malefícios que o consumo em excesso de bebidas alcoólicas trazem ao corpo, como dor de cabeça, desidratação e enjoo, elas também podem gerar sintomas emocionais.
Nos Estados Unidos, já existe até um termo para se referir ao problema: “hangxiet”, que é uma mistura das palavras ressaca com ansiedade, em inglês. A explicação está na maneira como o álcool interfere nos neurotransmissores que regulam o humor e o sono, conforme explica o psiquiatra Emerson Rodrigues Barbosa, coordenador do Instituto de Psiquiatria do Paraná (IPPr). Confira a seguir.
Efeito do álcool no cérebro
“Durante o consumo de álcool, o cerébro aumenta o GABA, neurotransmissor que reduz a atividade cerebral e provoca sensação de relaxamento”, explica. Paralelamente, o órgão também inibe o glutamato, principal neurotransmissor excitatório do sistema nervoso central, que atua na transmissão de sinais elétricos entre os neurônios. “Mas isso é passageiro. O corpo logo entra em modo de compensação, tentando reequilibrar essa química alterada — e é aí que começam os efeitos ansiosos”, resume o especialista.
Sendo assim, quando o relaxamento passa, há queda do GABA, aumento do glutamato e ativação do eixo do estresse, o que eleva níveis de adrenalina, noradrenalina e cortisol. “Além disso, no dia seguinte, o álcool reduz a liberação de dopamina (neurotransmissor ligado à regulação do humor e à motivação). Isso gera um ‘baque’ emocional que contribui para a apatia e a irritabilidade”, completa o psiquiatra.
Em relação ao impacto no sono, o especialista ressalta que o álcool prejudica a fase do sono chamada de REM, que se caracteriza por uma movimentação cerebral intensa e, ao mesmo tempo, relaxamento muscular. Essa alteração no ciclo do sono também favorece a “ressaca moral”, uma vez que diminui a agilidade mental e aumenta a irritabilidade. Em resumo, embora a bebida alcoólica possa ajudar uma pessoa a adormecer, a qualidade do sono será ruim.
“Hangxiet” é mais intensa em pessoas ansiosasEm pessoas com histórico de ansiedade, o “efeito rebote” pode ser ainda mais intenso – como mostrou um estudo da Escola de Saúde Pública da Universidade de Nevada, nos Estados Unidos. “O que começou como ‘só um drink para relaxar’ termina como uma espiral de pensamentos acelerados, taquicardia e sensação de perda de controle”, alerta o psiquiatra Emerson Rodrigues Barbosa, coordenador do Instituto de Psiquiatria do Paraná (IPPr).
Para completar, existe o risco do problema se transformar em um ciclo vicioso. “A pessoa bebe para se sentir melhor, mas o efeito de curto prazo se transforma em mais ansiedade no dia seguinte. O que pode fazer com que ela queira beber de novo, criando um padrão de uso autojustificado, porém perigoso”, pondera o especialista.
E como saber se você está sofrendo de ansiedade ou crise de pânico pós-álcool? Preste atenção a esses sinais:
Taquicardia (batimento acelerado do coração).
Sudorese fria.
Respiração ofegante.
Sensação de desmaio.
Pensamento acelerado ou catastrófico.
Vontade de fugir ou buscar ajuda urgente.
Esses sintomas podem surgir sem causa aparente, além de provocar uma sensação intensa de morte ou perda do controle. Mesmo assim, atenção: é comum que os exames médicos do paciente nesse estado continuem normais, segundo o psiquiatra.
Não existe dose segura de álcoolNão existe uma dose totalmente segura de álcool, já que a substância traz inúmeros malefícios à saúde mesmo em pequenas quantidades. Diversos estudos relacionam o consumo, por exemplo, a um risco aumentado de vários tipos de câncer. E não é de hoje: um estudo feito por cientistas italianos, em 2014, mostrou que mesmo pequenas quantidades de álcool (como 1 taça de vinho por dia, por exemplo) aumentam a chance de câncer de mama e intestino, especialmente em mulheres.
Além da conhecida recomendação para beber com moderação, o médico indica outra medida simples: intercalar a bebida com água. Como muitos dos sintomas físicos da ressaca estão relacionados à desidratação causada pelo álcool, essa dica pode amenizar os efeitos negativos. Já em relação aos sintomas emocionais, o médico sugere mais atenção ao seu comportamento no dia seguinte. “A tolerância está diminuindo, mesmo quando você bebe pouco? Os sintomas estão mais comuns? Nesses casos, vale considerar uma avaliação profissional. Porque a bebida pode, inclusive, estar mascarando problemas como ansiedade e depressão não tratados”, afirma Emerson Rodrigues Barbosa, coordenador do Instituto de Psiquiatria do Paraná (IPPr).
O médico ressalta que o álcool é uma droga psicoativa. Embora seja socialmente normalizado, ainda assim impacta diretamente o cérebro, o corpo e os relacionamentos. “Quanto menos, melhor. E, para algumas pessoas, o ideal é simplesmente não consumir”, conclui.
IstoÉ