Salvador, diretor da Google e o novato na saúde

Apesar de também haver uma marca de continuidade, os secretários de Estado aumentam (de 41 para 43) e há 15 mexidas (entre novos e mudanças de pasta) e ainda uma promoção (de quem passa a Adjunto do governante). Salvador Malheiro é o nome mais conhecido entre os novos secretários de Estado, ele que foi vice-presidente de Rui Rio e um dos grandes responsáveis pela derrota de Luís Montenegro em diretas contra o antigo autarca do Porto — pelo controlo que tinha do aparelho laranja. O primeiro-ministro já tinha colocado o antigo autarca de Ovar na lista de deputados em 2024 e agora promove-o a secretário de Estado.
Cristina Vaz Tomé resistiu quando houve remodelação de secretários de Estado, mas já não entra no novo elenco de Ana Paula Martins, na Saúde. Para o seu lugar entra Francisco Rocha Gonçalves. Há casos como o de Emídio Sousa e Ana Isabel Xavier (que saem do Ambiente e da Defesa) para os Negócios Estrangeiros, com a pasta das Comunidades e Negócios Estrangeiros e Cooperação. O novo ministério, da Reforma do Estado, traz também dois estreantes: um até agora vice-presidente da Google (Bernardo Correia) e um antigo conselheiro de Carlos Moedas (Paulo Magro da Luz). Na Justiça também mudam as duas secretarias de Estado.
Salvador Malheiro não é o único deputado que tem um upgrade para governante: o mesmo acontece com João Valle e Azevedo, que passa a secretário de Estado da Presidência. No mesmo ministério, o chefe de gabinete de Leitão Amaro, Tiago Maceirinha é promovido a secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministro. Eis as várias novidades na escolha dos secretários de Estado.
Ministério dos Negócios EstrangeirosEmídio SousaOs recém-chegados ao Ministério dos Negócios Estrangeiros têm uma característica óbvia em comum: são repetentes do primeiro executivo de Luís Montenegro que transitaram de outros Ministérios. Emídio Sousa integrou, até aqui, a secretaria de Estado do Ambiente, no Ministério de Maria da Graça Carvalho. Agora, passa a ter a secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, uma pasta que, no último governo, tinha ficado entregue ao veterano José Cesário.
Nestas eleições, tal como em 2024, voltou a ser eleito pelo círculo de Aveiro. Mas desta vez, não foi cabeça de lista, mas número dois, apenas atrás de Luís Montenegro. Antes da entrada no governo, Emídio Sousa focou a sua carreira política na administração local, o que coincide com a sua licenciatura em Administração Autárquica e o mestrado em administração pública. Foi, durante 11 anos (entre 2013 e 2024) presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira e ocupou outros cargos de liderança em empresas regionais.
Ana Isabel XavierA transição entre ministérios de Ana Isabel Xavier será uma mudança menos acentuada que a de Emídio Sousa. A nova secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação foi, durante o último governo, secretária de Estado da Defesa Nacional, no Ministério liderado por Nuno Melo. Para além de professora e investigadora, antes de chegar ao executivo foi subdiretora geral de Política de Defesa Nacional e integrou durante nove anos uma equipa da Comissão Europeia para a cooperação entre educadores – o seu currículo divide-se assim, entre a área que ocupou e aquela para que transita agora. No ano passado, antes de integrar o executivo, propunha-se a aumentar os gastos com Defesa do país para os 2%. Alcançou um aumento histórico de 1,58%, mesmo que não tenha conseguido a marca pretendida. O enquadramento global atual obriga, naturalmente, à articulação entre os dois Ministérios, pelo que a experiência no Ministério da Defesa Nacional não deve ser excluída. Este ano, integrou a lista da AD em Lisboa, onde foi a 15.ª – e última – eleita.
Desde as eleições de 2024 que João Valle e Azevedo assumiu cada vez maior protagonismo dentro da estrutura do PSD. Foi deputado pelo PSD, com as áreas económicas. Um ano depois de conhecer os Passos Perdidos, vai agora para o edifício que foi da Caixa Geral de Depósitos. Fica ao lado de Leitão Amaro na pasta da secretaria de Estado da Presidência. João Valle e Azevedo é quadro do Banco de Portugal, mas foi suspenso, segundo contou a Sábado, por Mário Centeno quando este descobriu, alegadamente pelos jornais, que Valle e Azevedo colaborava com o PSD, em 2023. Tinha, no Banco de Portugal, responsabilidades na área da política monetária. E é agora o Governo que passa a integrar que tem de decidir a recondução ou o mais provável a substituição do governador. Valle e Azevedo já tinha trabalho para os social-democratas, na altura de Passos Coelho. As colaborações com o PSD foram várias.
Licenciado em Matemática Aplicada à Economia e Gestão, pelo ISEG, tem doutoramento em Economia pela Universidade de Stanford e um mestrado em estatística pela London School of Economics.
Tiago MacieirinhaHomem da confiança de António Leitão Amaro, Tiago Macieirinha, 43 anos, já era seu chefe de gabinete e sobre agora a secretário de Estado da Presidência, passando a uma posição de relevo no centro do Governo. Tem experiência na Academia – é professor auxiliar convidado da Escola de Lisboa da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, onde se licenciou e doutorou com 18 valores (a 24 de outubro de 2024 defendeu uma tese intitulada “Entre a legalidade e a proporcionalidade na atividade administrativa vinculada”); além disso, coordena a pós-gradução em Direito na mesma faculdade e tem publicado e investigado nas áreas de Direito Administrativo, do Contencioso Administrativo, dos Direitos Fundamentais e do Direito da Saúde. Mas também acumula experiência na política: foi adjunto do secretário de Estado Adjunto de Paulo Macedo e assessor jurídico do gabinete de Pedro Passos Coelho no seu Governo (e no curto Governo de 27 dias que se seguiu).
Macieirinha foi também membro da Comissão de Ética para a Saúde na Universidade Católica Portuguesa e já se manifestou publicamente sobre essa área. No Observador, publicou um artigo de opinião em que criticava duramente a lei que despenaliza a eutanásia (ainda por regulamentar, tendo o Tribunal Constitucional considerado inconstitucionais alguns dos seus artigos), defendendo que os “deputados do regime” se preparavam para aprovar a proposta a que chamavam lei da “morte medicamente assistida”, “em mais um exemplo orwelliano de manipulação da linguagem que só podemos atribuir ao mau gosto ou ao humor negro”. Considerava que a antecipação da morte seria “tudo o que os deputados do regime têm para oferecer ao país”. “É a desistência de tudo, tal como o regime parece já ter desistido de tornar Portugal um País decente e apresentável”, rematava, num texto em que criticava o estado da Saúde e a falta de acesso aos cuidados paliativos.
[A polícia é chamada a uma casa após uma queixa por ruído. Quando chegam, os agentes encontram uma festa de aniversário de arromba. Mas o aniversariante, José Valbom, desapareceu. “O Zé faz 25” é o primeiro podcast de ficção do Observador, co-produzido pela Coyote Vadio e com as vozes de Tiago Teotónio Pereira, Sara Matos, Madalena Almeida, Cristovão Campos, Vicente Wallenstein, Beatriz Godinho, José Raposo e Carla Maciel. Pode ouvir o 3.º episódio no site do Observador, na Apple Podcasts, no Spotify e no Youtube Music. E o primeiro episódio aqui e o segundo aqui.]
Foi também crítico das decisões tomadas, sem enquadramento jurídico próprio, durante a pandemia, como escreveu noutro artigo de opinião: “A ausência de enquadramento jurídico sólido, claro e transparente, somada à tentação pela informalidade e pelo improviso, quando não pelo arbítrio, não representa apenas uma ameaça ao Estado de Direito (aos direitos das pessoas em face do Poder), mas produz dano considerável no combate eficaz, organizado e coerente à pandemia”, argumentava, acusando o Governo de António Costa de decidir em modo “navegação à vista” e utilizando “fórmulas jurídicas vagas”.
Também no Observador, Macieirinha chegou a pronunciar-se sobre uma daquelas que serão as bandeiras deste Governo – a reforma do Estado – criticando a aprovação da Comissão Independente para a Descentralização (que acabaria, na altura, por produzir um relatório defendendo a regionalização). “É preciso alguma dose de ingenuidade ou voluntarismo para assumir que é possível conceber uma reforma séria do Estado com sete personalidades num espaço de um ano”, criticava, alertando que em tempo de “celebração e concórdia” – PS e PSD tinham concordado em criar a comissão – seria preciso estar atento ao risco de “apatia e apagamento dos contrapesos dos regime”.
“Com efeito, a organização administrativa do Estado não é matéria politicamente neutra e caberia ao Governo e à AR estudar, preparar e levar a cabo uma reforma da organização do Estado, ao invés de confiar a tarefa de estudo e planeamento a comissões independentes, cuja legitimidade, recursos, expertise e meios para o efeito são manifestamente rarefeitos”, defendia então. Este Governo terá a oportunidade de passar da teoria para a prática.
Ministério da Reforma do EstadoBernardo CorreiaNo agora criado Ministério da Reforma do Estado, duas novidades. Uma delas vem mesmo da big tech Google. Bernardo Correia que era o responsável máximo em Portugal da gigante tecnológica desde 2016 deixa o cargo para assumir uma posição de secretário de Estado para a digitalização.
Licenciado em Economia pela Universidade Nova de Lisboa (1995-2000), foi em 1999 estudar para Viena. O seu primeiro trabalho foi como jornalista, na Exame Informática. “Foi o meu primeiro emprego pós-faculdade foi ser jornalista e entrevistar diretores-gerais de empresas de tecnologia. Primeiro de todos foi o diretor-geral da HP na altura”, contou ao Expresso. Do jornalismo dá o salto para o marketing, na L’Óreal e na Unilever. E foi esta empresa de grande consumo, multinacional, que lhe permitiu uma carreira internacional – foi para Londres. Carreira internacional e também uma carreira no digital. Aí entrou para a área de comércio digital. Em Londres, em 2008, abriu a porta da Google, primeiro para o relacionamento da companhia com a indústria de bens de consumo. Ao Expresso comentou: “Fiquei no Google UK durante muitos e bons anos e foi uma experiência incrível”, para acrescentar: “Anos de Google é um bocadinho como anos de cão, tem de se multiplicar por sete.” Juntou dois mundos. A mãe era professora de inglês, o pai engenheiro. Bernardo Correia, economista, mas com uma paixão nas tecnologias. “É uma paixão desde pequenino. Tem muito a ver com os meus pais, essencialmente com a profissão do meu pai, que era engenheiro civil e trabalhava no LNEC”, contou ao podcast “O CEO é o Limite”, do Expresso, em março de 2024. Escolheu Economia em vez de informática porque nas” viagens com os pais queria perceber “como é que podíamos ser mais ricos”. Para Bernardo Correia, um líder deve ter a capacidade de inspirar e dar uma visão apaixonante, mas deve sair da frente. “Serei bem sucedido na minha carreira no dia em que me tornar redundante”, disse ainda ao Expresso, a quem contou que quando era jovem enviou um currículo a George Lucas, criador de Star Wars. “Obviamente não recebi resposta”, contou.
Na outra pasta da Reforma do Estado fica Paulo Magro da Luz. Assume a secretaria de Estado para a Simplificação. Licenciado em engenharia, tem um MBA em Finanças. Teve uma passagem breve no Ministério das Finanças de Bagão Félix, do Governo de Santana Lopes (2004.2005), no âmbito de uma intenção de reforma da administração pública. Agora regressa aos corredores do poder para secretário de Estado da Simplificação, deixando Carlos Moedas, com quem trabalhava na Câmara de Lisboa nos programas de transformação. Conforme noticiou o Observador, o autarca lisboeta recrutou para o seu gabinete o amigo Paulo Magro da Luz quando já tinha o número máximo de assessores. Moedas considerou este caso “um não tema”.
Moedas contratou serviços de um amigo através de uma empresa após atingir limite legal de assessores
Antes esteva na empresa de recrutamento Egor. Passou, na sua vida profissional, pela Andersen Consulting que deu lugar à Accenture, onde diz que trabalhou projetos internacionais com ligações ao setor financeiro. A CapGemini e a Novabase deram a ligação ao setor público, já que era nessa indústria que se movia. Ainda esteve na CGI com a área de energia e infraestruturas, onde teve a oportunidade de liderar o negócio em Espanha. Foi então que decidiu criar uma sociedade de capital de risco, que deixou para entrar na Egor. A capital de risco, segundo o seu LinkedIn é a Quadrantis, mais conhecida por estar ligada a João Koehler, o “tubarão” que esteve na lista candidata ao FC Porto, liderada por Pinto da Costa (já falecido), nas eleições que tiveram a vitória de André Villas-Boas.
Ministério da DefesaNuno Pinheiro TorresA Defesa Nacional será, porventura, uma das áreas de governo com mais projeção internacional nos próximos anos. Com uma guerra em curso na Ucrânia, e com as exigências dos Estados Unidos — e o anuimento do secretário-geral da NATO — para que os países-membros da NATO reforcem os orçamentos na vertente militar, Nuno Pinheiro Torres é chamado a assumir uma secretaria de Estado reconfigurada e promovida.
Se, no primeiro governo de Luís Montenegro, o ministro da Defesa contava apenas com um secretário de Estado Adjunto, agora, na versão 2.0 do Executivo, Nuno Melo mantém dois secretários de Estado, mas sobe o segundo a Adjunto. Pinheiro Torres tomará posse como secretário de Estado Adjunto da Política de Defesa Nacional (o centrista Álvaro Castello-Branco mantém-se como Adjunto e da Defesa Nacional). Terá, por isso, a responsabilidade de definir, entre outras, toda a política de investimento nas Forças Armadas portuguesas.
Nomeado, há menos de sete meses, pelo primeiro-ministro como membro executivo do Conselho de Administração da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, Nuno Pinheiro Torres já tinha assumido, ao longo de oito anos e de governos de duas cores políticas (2012-2020), as funções de diretor-geral de Política de Defesa no Ministério da Defesa Nacional. Era, também, professor de Direito Internacional e Direito Internacional Criminal na Universidade Católica.
Ministério da JustiçaGonçalo Viegas PiresRita Alarcão Júdice segue para o novo Governo com uma equipa de secretários de Estado completamente nova no Ministério da Justiça: saem Maria Clara Figueiredo e Maria José Barros, entram para os seus lugares Gonçalo Viegas Pires e Ana Luísa Machado. Ou também podemos dizer: saem uma juíza desembargadora e uma gestora, entram um juiz de direito e uma jurista (e antiga chefe de gabinete da predecessora).
Gonçalo Viegas Pires, de 48 anos, assume a condição de ‘braço-direito’, enquanto secretário de Estado Adjunto e da Justiça, depois de ter ocupado nos últimos oito anos o cargo de inspetor-geral dos Serviços de Justiça. Assumiu a posição em regime de substituição em fevereiro de 2017, foi nomeado de forma efetiva em março de 2018 pela antiga ministra Francisca Van Dunem e viu as suas comissões de serviço sucessivamente renovadas ao longo do tempo.
Num cargo sem mediatismo, esteve, porém, ligado a um recente caso mediático, ao liderar a inspeção ordenada por Rita Alarcão Júdice aos serviços prisionais, na sequência da fuga de cinco reclusos da prisão de Vale de Judeus, em setembro de 2024. A auditoria aos sistemas de segurança e vigilância dos 49 estabelecimentos prisionais identificou múltiplas deficiências a vários níveis, debilidades essas que, agora, enquanto secretário de Estado, terá de ajudar a solucionar.
Juiz de direito, Gonçalo Viegas Pires formou-se em 2002 na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, tendo entrado para o Centro de Estudos Judiciários dois anos depois. Ingressou posteriormente nos tribunais, passando pelas comarcas de Faro, Ponta do Sol, Barreiro, Lisboa, Torres Vedras, Loures, Sintra, Oeiras, Vila Franca de Xira, Seixal, Lisboa e Almada.
Ana Luísa MachadoAna Luísa Machado, de 47 anos, deixa a presidência do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ), onde estava em regime de substituição desde dezembro passado, para ocupar o cargo de secretária de Estado da Justiça. Curiosamente, já tinha estado perto deste cargo, ao ter sido chefe de gabinete da antecessora, Maria José Barros, entre abril e dezembro de 2024.
Formada em Direito pela Universidade Católica Portuguesa (1995-2002) e com um mestrado na mesma área pela Faculdade de Direito do Porto, entre 2020 e 2022, Ana Luísa Machado trabalhou de perto com a ministra da Justiça nos últimos meses. Esteve ao lado de Rita Alarcão Júdice para o lançamento de vários projetos, como o protocolo para o arranque do pólo do Centro de Estudos Judiciários em Vila do Conde, além de ter sido nomeada em fevereiro para integrar o Comité para a Eficiência, Inovação e Sustentabilidade, um organismo concebido para combater ineficiências e gerar poupanças no setor judicial.
Antes do IGFEJ ou do anterior Governo, a nova secretária de Estado esteve entre 2011 e 2024 nos serviços jurídicos da Fundação de Serralves, contando ainda com algumas experiências internacionais, nomeadamente Brasil e Moçambique. Em simultâneo, acumulou estas posições com o exercício da advocacia entre 2004 e 2024.
Ministério da Administração InternaRui Novo RochaUm dia depois de ter sido conhecida como nova ministra da Administração Interna, e no dia em que tomou posse, Maria Lúcia Amaral admitiu que não tinha “uma pasta fácil” e, por esse motivo, ia já começar a “estudar os dossiês” para estar em condições de liderar um ministério sempre complexo. Talvez para facilitar a transição do lugar que era antes ocupado por Margarida Blasco, a equipa em torno da ministra não mudou muito e foi até reforçada com um novo nome: Rui Novo Rocha.
Figura conhecida dentro do Partido Social Democrata, onde é, desde outubro de 2024, um dos vice-presidentes, vai passar a desempenhar as funções de secretário de Estado da Proteção Civil, ocupando o cargo que era anteriormente de Paulo Simões Ribeiro, que passa a ser secretário de Estado Adjunto da Administração Interna — Telmo Correia continua a ser Secretário de Estado da Administração Interna.
A figura nova deste tabuleiro responsável pela área que tutela um campo vasto, desde a polícia à proteção civil, não cai de paraquedas nestes assuntos. Nos últimos tempos, era o coordenador de segurança e proteção civil no Conselho Estratégico Nacional do partido.
O vínculo a Ansião, no distrito de Leiria, foi aprofundado nos oito anos em que foi liderou a autarquia, entre 2009 e 2017. Na pasta da Proteção Civil, terá responsabilidade imediata, face ao aproximar do verão que avizinha um sempre acirrado combate aos incêndios, matéria à qual está intimamente ligado — é, ainda hoje, Presidente da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Ansião e Presidente da Federação dos Bombeiros do Distrito de Leiria.
Em janeiro de 2023, uma notícia da Sábado revelava que Rui Rocha tinha sido contratado por uma empresa um mês depois de lhe adjudicar mais de 72 mil euros enquanto autarca de Ansião. Na altura, o agora secretário de Estado disse que os “procedimentos concursais” tinham sido “desenvolvidos com o respeito pelo enquadramento legal” e justificou que a empresa referida era “uma referência nacional” na sua área de atuação.
Tal como o ministério, também a própria Proteção Civil mudou de mãos, uma vez que, além de ter um novo Secretário de Estado, há pouco mais de dois meses assumiu funções o novo comandante nacional da Proteção Civil, Mário Silvestre, que sucedeu a André Fernandes. O anterior comandante pediu demissão por “motivos pessoais” em março. A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, por sua vez, tem novo presidente desde janeiro, quando José Manuel Moura tomou posse.
Paulo Simões RibeiroMal tinha acabado de tomar posse, a nova ministra da Administração Interna já reconhecia que tinha de “estudar os dossiês” para estar à altura de uma pasta exigente com uma área de tutela vasta. Para a ajudar nos estudos, poderá contar com dois nomes que transitam da organização de Margarida Blasco, a anterior ministra.
São eles Telmo Correia (que continua como Secretário de Estado da Administração Interna) e Paulo Simões Ribeiro (que passa a ser Secretário de Estado Adjunto da Administração Interna deixando o cargo de Secretário de Estado da Proteção Civil para Rui Novo Rocha, a cara fresca da equipa que acompanha a provedora que passou a ministra).
Se o primeiro — o único que foge aos quadros do PSD, já que é Vice-Presidente do CDS-PP — não muda o cargo, Paulo Simões Ribeiro salta para Administração Interna, onde será adjunto de Maria Lúcia Amaral.
Ao contrário de Telmo Correia, que ficou a um lugar de ser eleito no círculo de Lisboa, Paulo Simões Ribeiro foi eleito deputado nas legislativas de maio, nas quais era o número dois da coligação PSD/CDS no círculo eleitoral de Setúbal.
Ainda como secretário de Estado da Proteção Civil, Paulo Simões Ribeiro trabalhou até ao lavar dos cestos, assinando um despacho no final de maio no qual prolongava o prazo para limpeza de terrenos florestais (mais uma vez), antevendo um tema sempre quente ligado à gestão governamental de prevenção e combate aos incêndios.
Agora sem responsabilidade direta nessa pasta, que passa para Rui Novo Rocha, o anterior secretário de Estado da Proteção Civil esteve debaixo de fogo na sequência dos incêndios que assolaram Portugal em setembro do ano passado — momento difícil para Margarida Blasco, que foi acusada pela oposição de não dar a cara pelos problemas e teve que responder a uma autarca que disse que não tinha conseguido entrar em contacto com a ministra.
Antes desses fogos, Paulo Simões Ribeiro tinha sido chamado ao Parlamento, onde, ao lado do Presidente da Proteção Civil, prometeu mais bombeiros, mais carros e mais helicópteros para combater as chamas — até julho, quando foram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o governante admitiu que os 3 mil hectares de área ardida até então não representavam “um stress tão grande quanto nos outros anos”. Os números pioraram consideravelmente com os incêndios de setembro.
Agora já fora da responsabilidade de Paulo Simões Ribeiro, a gestão dos incêndios continua a ser um tema fulcral na Administração Interna. Mudando de pasta, e passando a trabalhar mais diretamente com a nova ministra, o setubalense continuará a lidar com esta matéria.
Curiosamente, Telmo Correia e Paulo Simões Ribeiro têm ambos fortes ligações ao futebol que transcendem a esfera emocional. O vice-presidente do CDS-PP chegou a ser secretário da Mesa da Assembleia Geral da SAD do Benfica — cargo que deixou quando tomou posse na Administração Interna — e Paulo Simões Ribeiro foi vice-presidente do Vitória Futebol Clube de Setúbal, durante três anos.
Ministério da Educação, Ciência e InovaçãoCláudia SarricoDe três para quatro: no Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) houve um aumento do número de secretarias de Estado, assim como uma reorganização das mesmas.
Nasce agora a secretaria de Estado do Ensino Superior (uma área que na última legislatura se diluía nas restantes), que será coordenada por Cláudia Sarrico. É professora de Gestão na Universidade do Minho, à semelhança do ministro que terá a tutela da pasta, Fernando Alexandre.
O seu currículo é vasto, dedicado à área científica, e passa também por instituições estrangeiras, uma vez que depois de se licenciar (em Engenharia e Gestão Industrial) na Universidade de Aveiro doutorou-se em Industrial and Business Studies no Reino Unido, na Warwick Business School.
Já foi assessora do conselho diretivo da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e do gabinete de estudos e análise da A3ES (a agência responsável pela Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, que tem sido alvo de críticas por parte de Fernando Alexandre).
Foi ainda professora associada no ISEG (a escola de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa), investigadora sénior no Centro de Investigação e Políticas do Ensino Superior e esteve destacada como analista de políticas na OCDE.
Helena CanhãoQuanto à secretaria de Estado da Ciência, a pasta cresceu e passou agora a incluir a Inovação (que anteriormente se inseria na secretaria de Estado da Administração Escolar). Sai assim a professora da área de Inteligência Artificial do Instituto Superior Técnico Ana Paiva, e a pasta passa a ser coordenada por Helena Canhão, diretora e professora catedrática de Medicina na Universidade Nova de Lisboa.
Especialista em Reumatologia, Helena Canhão é responsável pela unidade da sua especialidade no hospital de Santo António dos Capuchos e é também coordenadora clínica desta unidade no hospital privado CUF-Tejo. É ainda presidente da Sociedade Portuguesa de Reumatologia, da qual já tinha sido vice-presidente (entre 2004 e 2006). Foi também diretora clínica da Raríssimas (em 2013/2014) e fez várias investigações na área da epidemiologia, bioestatística e investigação clínica em colaboração com a Universidade de Harvard (tendo recebido o prémio Senior Clinical Award do programa Harvard-Portugal).
Ministério da SaúdeFrancisco Rocha GonçalvesPara o lugar da contestada Cristina Vaz Tomé, entra o gestor Francisco Rocha Gonçalves. O novo secretário de Estado da Gestão da Saúde sai de um lugar de topo na farmacêutica Sanofi diretamente para a Avenida João Crisóstomo (sede do Ministério da Saúde). Ao contrário da sua antecessora, Rocha Gonçalves tem experiência de gestão na área da saúde: de 2011 a 2018, integrou o Conselho de Administração do Instituto Português de Oncologia do Porto; no currículo tem ainda uma curta passagem (de apenas seis meses) pelo Conselho Executivo da Parceria Público-Privada do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures. É, assim, um gestor com experiência na gestão de uma EPE (Entidade Pública Empresarial), mas também de uma PPP, o que se poderá revelar-se importante, numa altura em que o Governo prepara o lançamento dos concursos para a constituição de cinco PPP hospitalares.
Doutorado em gestão pelo Instituto Superior de Economia e Gestão, é também mestre e licenciado em Economia pela Faculdade de Economia do Porto, especializado em direção e gestão de unidades de saúde e em fármaco-economia. No início de 2021, depois de sair da Luz Saúde (o grupo privado de saúde que detinha a concessão do Beatriz Ângelo), foi nomeado para o cargo de Head of Market Access & Public Affairs da farmacêutica francesa Sanofi.
Tem ainda experiência ao nível da consultoria na área da gestão e tecnologias de saúde, tendo trabalhado com governos, instituições várias, farmacêuticas e órgãos governamentais de diversos países. Francisco Rocha Gonçalves foi também o coordenador do livro “A Gestão de Saúde Baseada no Valor — Casos e Experiência Portuguesa”, lançado em 2020, e que se foca na gestão hospitalar, dando a conhecer o conceito de Value Based Healthcare, uma ferramenta de gestão que persegue três objetivos: melhores resultados clínicos, melhor satisfação dos doentes e menores custos possíveis.
Aos 50 anos, terá, porventura, pela frente a mais desafiante experiência profissional da carreira, num dos ministérios mais complexos de qualquer governo.
Ministério do Ambiente e EnergiaJoão Manuel EstevesJoão Manuel Esteves estava no final do terceiro mandato como presidente da Câmara Municipal de Arcos de Valdevez quando suspendeu funções em abril para preparar a entrada no Parlamento ao qual concorreu como deputado do PSD. Nascido em 1968 é licenciado em Matemática e com mestrado em gestão pela Universidade do Porto entrou para a autarquia de Arcos de Valdevez em 1994 como vereador. Foi vice-presidente e assumiu vários cargos autárquicos com uma grande diversidade de pelouros. Entre 2009 e 2011 foi tesoureiro da Santa Casa da Misericórdia de Arcos de Valdevez e depois esteve à frente da coordenação do centro de incubação de empresas de base tecnológica. Em 2017, foi eleito para um segundo mandato à frente da autarquia, tendo sido reeleito em 2021 para um terceiro e último mandato ao qual renunciou. Foi eleito pelo círculo de Viana do Castelo, tendo sido agora nomeado como secretário de Estado do Ambiente, substituindo Emídio Sousa que foi para a secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas.
Ministério da Agricultura e MarSalvador MalheiroA secretaria de Estado do Mar muda de ministério e de governante. Lídia Bulcão sai para dar lugar a um destacado dirigente social-democrata: Salvador Malheiro. O ex-presidente da Câmara de Ovar, cargo que ocupou entre 2013 e 2024, era atualmente deputado, após ter sido eleito pelo círculo de Aveiro nas legislativas do ano passado. Abdicou, aliás, do mandato em Ovar, para tomar posse na Assembleia da República. No último ano presidiu à comissão de Ambiente e Energia. Energia é, aliás, a especialização de Salvador Malheiro,
que é doutorado em Energia e Ambiente, participando com frequência em conferências sobre o tema. Chegou a coordenar no Conselho Estratégico do PSD a área do Ambiente e Energia. Um dos desafios da área do Mar vai ser o lançamento do primeiro leilão eólico offshore, um processo que se arrasta há vários meses e cujas regras deverão estar definidas até outubro. Apesar de ser um dossier da área da Energia, o Mar também tem aqui uma palavra a dizer. O despacho relativo ao lançamento das regras do concurso foi assinado pelos secretários de Estado do Mar e da Energia.
Salvador Malheiro, de 52 anos, ajudou Rui Rio a chegar à liderança do PSD e foi vice-presidente do partido durante a sua liderança.
Em fevereiro do ano passado, o Ministério Público abriu um inquérito relacionado com um caso de alegada corrupção que envolvia Salvador Malheiro, após uma denúncia. O antigo militante do PSD e líder do Chega de Ovar, Mário Monteiro, acusou Salvador Malheiro de ter recebido envelopes com dinheiro em troca da adjudicação de uma obra. O agora nomeado secretário de Estado apresentou uma queixa-crime contra o autor da denúncia.
Mas Malheiro foi multiplicando polémicas ao longos dos anos. Ainda em 2018, quando era autarca de Ovar, esteve envolvido num caso de adjudicações de contratos para obras no valor de 2,2 milhões de euros para a instalação de relvados sintéticos em clubes e associações do concelho. Os contratos beneficiaram a Safina, uma empresa detida pelo presidente da concelhia do PSD, Pedro Coelho, que viria a ser o seu vereador para as Obras Municipais. Em 2021, a câmara que ainda liderava foi alvo de buscas no âmbito de uma investigação relacionada com processos de obras particulares e contratos programa.
Noutro caso, que o Observador revelou em fevereiro de 2019, Malheiro somou várias viagens com o carro ao serviço da presidência da Câmara Municipal — um Lexus LS500h avaliado em 75 mil euros — para se deslocar a eventos partidários, num possível caso de peculato de uso. Outro caso, revelado em março de 2019 mas que dizia respeito ao Euro2016, foi o das viagens pagas pela Olivedesportos para se deslocar a França para assistir a jogos da seleção nacional.
Em vários dos casos, o Ministério Público confirmou a abertura de inquéritos-crimes para investigar os factos que envolviam o ex-autarca de Ovar. Mas as conclusões (ou a própria evolução) dos diferentes processos nunca chegou a ser conhecida.
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