Decidir com base nos dados. Mas que dados?

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Decidir com base nos dados. Mas que dados?

Decidir com base nos dados. Mas que dados?

Estamos no meio de uma crise de imigração que se desenvolveu nos últimos anos de forma descontrolada e desregulada. Afinal, quantos imigrantes estão a viver no país? A resposta certa é que não sabemos.

Os números indicados pela Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA) para o número de estrangeiros com o estatuto de residente em autorizado em Portugal (1,57 milhões) não batem certo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) para a população total residente no país (10,7 milhões no final de 2024).

A evolução desta estatística nos anos mais recentes não reflecte o crescimento da imigração. Aparentemente, os dados da AIMA são mais fiáveis, porque têm por base o número de processos burocráticos tratados. Então onde estão esses imigrantes, aparentemente invisíveis na estatística da população residente? Terão saído do país dentro do Espaço Schengen, sujeito a poucos ou nenhuns controlos fronteiriços? Estão em Portugal mas não são detectados pelas estatísticas? Porquê?

São perguntas que as dúvidas bem colocadas pelo Presidente da República suscitaram e a que ninguém sabe responder, entre serviços públicos perdidos nas suas teias de trocas de informação burocráticas, pouco eficientes e com visível dificuldade em acompanhar a evolução da realidade e das novas necessidades que esta coloca.

Estamos também, há cerca de uma década, numa crise de habitação que não pára de se agravar. O combate à escassez de habitação devia requerer, antes de mais nada, a mobilização dos recursos públicos existentes adequados à função. Se há falta de casas e se o Estado está a tentar pôr em marcha programas de construção de habitação nova, mandaria a mais básica racionalidade que se começasse por utilizar os imóveis do Estado que estão devolutos, alguns há vários anos. Quantos são e onde estão esses imóveis? Não sabemos.

Há décadas que o Estado tenta fazer o inventário do seu património imobiliário. Sem sucesso. Conhecemos alguns casos óbvios e mais mediáticos – a ex-sede do Ministério da Educação no centro de Lisboa ou espaços militares que foram transferidos para o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) há mais de três anos e lá continuam, fechados e a degradarem-se.

Repare-se. O Estado sabe com todo o detalhe os imóveis que cada cidadão tem: a morada, a área ocupada, idade do imóvel, se o prédio tem elevador ou não ou se tem uma piscina. Mas desconhece o que está ao seu cuidado para poder desenhar políticas urgentes e eficazes.

Temos um problema de escassez de professores, mais acentuado nalgumas disciplinas e que deixa, todos os anos, milhares de alunos sem aulas durante uma parte ou a totalidade do ano lectivo. Quantos são esses alunos, onde estão, e durante quanto tempo não têm professores? Não sabemos.

Neste caso até pensávamos que sabíamos. Mas o actual ministro da Educação teve a frontalidade de nos desenganar. Ele próprio ainda acreditou nos dados que os serviços forneciam, mas depois de uma polémica política rapidamente se concluiu que sim, todos os anos havia uns números que eram divulgados. Mas também que a fiabilidade dos dados era escassa, para dizer o mínimo.

São apenas três exemplos trazidos por assuntos da máxima importância que estão neste momento na mesa das políticas públicas. Eles revelam a fragilidade dos sistemas de informação e de estatística do país. Revelam, por isso, a fragilidade do conhecimento que temos das realidades sobre as quais governantes, autarcas, deputados e outros responsáveis públicos e privados tomam decisões todos os dias.

Parece evidente que quando se desconhece o ponto de partida com rigor não se acerta no caminho para chegar ao destino.

O nosso desleixo cultural com os dados, as estatísticas e a informação está na origem de dois problemas graves: a falta de eficácia das políticas públicas e o crescimento dos populismos baseados apenas em percepções. Porque não tenhamos dúvidas: quando não há dados rigorosos alguém se encarregará de os inventar para ocupar esse vazio.

observador

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