Combustível barato de Espanha gera suspeita de fraude fiscal

Pela informação obtida pelo Observador, estas empresas, muitas vezes, até cumprem um primeiro ciclo de pagamentos de IVA, falhando os seguintes e, ao fim de um ou dois incumprimentos, fecham as portas. São substituídas por outras empresas novas, o que dificulta a sua identificação, ainda que, por vezes, tenham os mesmos gestores. “Quando são apanhados, desaparecem”, sublinha o secretário-geral da EPCOL (a associação que representa as empresas petrolíferas). António Comprido indica que em Espanha terão aparecido 200 novos operadores (grossistas) num só ano.
O não pagamento do IVA corresponde a 23% do preço integrando o imposto petrolífero — qualquer coisa como 29 cêntimos por litro de gasóleo e 32 cêntimos por litro de gasolina — e permite uma enorme vantagem no preço do produto que oferecem aos revendedores. Estes podem, assim, praticar preços finais mais baixos do que os concorrentes ou aumentarem as margens num negócio onde estas são curtas.
Quem fica a perder são as petrolíferas e os fornecedores grossistas de combustíveis que perdem contratos e clientes. E o Estado que deixa de cobrar o IVA, caso se confirmem as suspeitas de evasão a este imposto que, segundo fontes do setor ouvidas pelo Observador, podem chegar às dezenas de milhões de euros. E, a prazo, perdem também os revendedores e clientes, avisa a ENSE.
Estes “comportamentos poderão colocar em causa a livre e justa concorrência entre os operadores do Sistema Petrolífero Nacional, com impactos potencialmente negativos nos preços dos combustíveis rodoviários.”
A ação desta semana resultou de um planeamento exaustivo conduzido pela ENSE em articulação com a Unidade de Ação Fiscal da GNR que responde também aos apelos feitos pelos operadores portugueses, nomeadamente por parte da associação que representa as petrolíferas nacionais.
O secretário-geral da EPCOL, António Comprido, confirma que algumas associadas sinalizaram que alguns dos seus clientes “têm sido aliciados com ofertas de preços muito abaixo dos praticados e difíceis de explicar”. E acrescenta que a associação que representa as principais petrolíferas em Portugal já alertou o Governo, através das secretarias de Estado da Energia e dos Assuntos Fiscais.
António Comprido diz que este problema sempre existiu, lembrando até estudos apresentados pela associação no passado a estimar a perda fiscal para o Estado decorrente de vários fatores. Mas reconhece que o problema se agravou nos últimos meses. Isto porque, admite, a malha de controlo a estes operadores apertou-se primeiro em Itália e, mais recentemente, em Espanha.
Há inclusive notícias na imprensa espanhola a dar conta de que as redes que atuavam em Espanha, nomeadamente através de empresas fantasmas que fugiam ao IVA, se deslocaram para Portugal. Este controlo mais apertado já fez a diferença para as petrolíferas que operam em Espanha, como é o caso da Galp que reportou no terceiro trimestre uma recuperação dos volumes vendidos naquele mercado. O Observador questionou a empresa sobre se sente quebra de vendas em Portugal na sequência da expansão destas redes, mas não obteve resposta.
A Galp é a principal fornecedora de combustível ao mercado retalhista e o Observador sabe que muitos dos seus clientes habituais foram aliciados por ofertas de preços muito mais baixos, entre 5 e 12 cêntimos por litro. Além do preço, há outras razões que prendem um revendedor a estes contratos como o pagamento de bónus por fidelidade ou por vendas e até a credibilidade da marca.
Apesar de acolher o reforço da fiscalização, o secretário-geral da EPCOL alerta para a necessidade de Portugal apertar também os critérios para permitir a importação de combustíveis porque a atual legislação “não é suficientemente dissuasora ou punitiva”. Este é um mercado de capital intensivo e “devia exigir a demonstração da capacidade financeira para cumprir obrigações fiscais, mas também legais”, como são os casos do pagamento para as reservas obrigatórias e de incorporação de biocombustíveis.
Espanha passou a proibir os retalhistas de venderem aos grossistas porque um dos truque usados por estas redes era fazer os combustíveis mudarem várias vezes de mãos até chegarem ao destino final. A obrigação de pagar o IVA à cabeça, ou a apresentação de uma garantia bancária, e o dever dos revendedores comunicarem, além das vendas, também as compras às autoridades são outras recomendações feitas pela associação.
Portugal só tem combustíveis mais caros que Espanha por causa dos impostos
O secretário-geral diz que há várias formas de ganhar vantagem no preço graças ao incumprimento das regras. Uma das situações que tinha mais expressão no passado era a venda de combustíveis com um nível de incorporação de biocombustíveis mais baixo ao exigido em Portugal, o que permite produto mais barato uma vez que os biocombustíveis têm um sobrecusto que pode ir até aos 10 cêntimos por litro. Outro truque é pagar o imposto petrolífero em Espanha onde é mais baixo e depois vender o produto em Portugal e encaixar a diferença. Mas o que dá mais vantagem é a fuga ao IVA.
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