Em Veneza, cineasta israelense critica guerra em Gaza

O diretor, roteirista e produtor israelense Hagai Levi criticou nesta terça-feira (2) a guerra deflagrada pelo governo de Benjamin Netanyahu contra o Hamas na Faixa de Gaza.
A declaração foi dada durante o Festival de Cinema de Veneza, cujos organizadores receberam uma carta de um grupo de atores, diretores e cantores para cobrar do mundo da cultura uma postura mais corajosa e uma condenação a Israel pelo "genocídio" cometido no enclave palestino.
"Há alguns dos meus amigos cineastas e roteiristas que assinaram o apelo sobre Gaza. É importante falar sobre isso aqui porque o que está acontecendo é horrível e precisa ser interrompido", declarou Levi, que apresenta sua série "Etty" no principal evento cinematográfico da Itália.
Fora de competição, a obra é estrelada por Julia Windischbauer, Sebastian Koch e Leopold Witte, e é baseada nos diários de Etty Hillesum, uma escritora judia holandesa que morreu em Auschwitz em 1943.
"Protestar é muito importante para mim, e acho que a série aborda questões que estão conectadas ao que está acontecendo, com os discursos de Etty contra o ódio, mas também fala sobre a desumanização das pessoas, da vida humana, de vê-las apenas como inimigas", explicou Levi.
Segundo o cineasta israelense, "é isso que acontece com este regime, que não só mata e aprisiona palestinos, mas também ataca seu próprio povo". No entanto, existem centenas de milhares de cidadãos israelenses lutando contra este regime.
"Só porque somos israelenses não significa que o apoiamos; lutamos nas ruas e, por mais tênue que seja, temos esperança de que as coisas possam mudar", enfatizou.
A série de Levi utiliza um cenário contemporâneo não especificado - em termos de vestimenta, transporte, objetos e estilos de mobiliário, sem celulares, tecnologia ou internet -, mas reconstitui integralmente o que aconteceu com Etty (interpretada magistralmente por Windischbauer) na Holanda ocupada pelos nazistas no início da década de 1940.
Considerada uma talentosa estudante universitária de 27 anos, Etty busca seu caminho no mundo, apesar de uma família sufocante e de ideias pouco claras sobre seu futuro. Após iniciar terapia com o psicólogo Julius Spier (Koch), que também se torna seu amante, ela vivencia uma profunda transformação interna e espiritual que a leva, ao perder tudo, a decidir não fugir, mas ficar e ajudar aqueles que compartilham seu destino.
Para Levi, a decisão de usar um cenário mais contemporâneo ajuda a "sentir esta história mais de perto", porque o que aconteceu naquela época "pode acontecer novamente, de uma maneira diferente". Basta olhar para o presente para saber "que coisas muito sérias e graves estão acontecendo".
"Em 7 de outubro, vi imagens do Holocausto, com famílias escondidas em armários ou outras exterminadas. E mesmo nas imagens de Gaza, o Holocausto não pôde deixar de ser visto. Temos a sensação de que o que está acontecendo não pertence apenas ao passado, mas também ao presente, e não podemos esquecer que uma figura de extrema direita está agora no poder na Holanda", afirmou.
Sobre os apelos de alguns grupos para um boicote a artistas israelenses, Levi comentou que "há uma razão para esse ressentimento em relação a Israel, e é parcialmente justificado, não podemos negá-lo, mas temos que ter cuidado".
De acordo com ele, "muitos israelenses, especialmente pessoas criativas e artistas, são contra este regime, a guerra e o que está sendo feito em nosso nome".
"Não adianta protestar contra artistas, porque muitos deles em Israel querem mudanças no país. Eles representam vozes opostas a este regime horrível", destacou.
Por fim, sobre a decisão de adaptar os diários de Etty Hillesum, publicados pela primeira vez em 1981, Levi explica: "É um livro que mudou minha vida. Me fez entender como, mesmo diante de tempos difíceis, é possível ganhar autonomia e uma força interior que torna as circunstâncias externas menos importantes. Quando isso acontece, como Etty escreveu, eles não podem tirar nada de você, mesmo que tudo seja tirado de você", finalizou.
terra