Mesmo com ações do governo, reservatórios de SP terminam agosto com 37,2% da capacidade

O temor de uma nova crise hídrica na região metropolitana de São Paulo, como a vivida entre 2014 e 2015, é descartada pela empresa de saneamento Sabesp e pelo governo do estado. No entanto, medidas foram tomadas nas últimas semanas como prevenção e, mesmo assim, os mananciais de água da região terminaram o mês de agosto com apenas 37,2% de sua capacidade total.
O sistema Cantareira, que é o maior dos sete mananciais da Grande São Paulo, abastecendo cerca de 9 milhões de pessoas, está com 34,6% de sua capacidade, o que gera preocupação nos órgãos que comandam os recursos hídricos no estado.
No início do mês, o volume já era o menor desde a grande crise, situação que piorou devido à chuva abaixo da média no inverno. Julho e agosto são, historicamente, os meses em que chove menos em São Paulo. No entanto, neste ano os volumes ficaram muito abaixo, de acordo com os registros do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) na estação do Mirante de Santana, na zona norte da capital.
Em julho, choveu apenas 15,6 mm quando a média é de 48,4 mm. Em agosto, o registro foi de 16,6 mm, ante a média de 32,3 mm. A situação é pior quando se observa a precipitação no sistema Cantareira. Segundo a Sabesp, a média histórica no sistema é de 34,2 mm em agosto, mas choveu apenas 5,1 mm nos 31 dias.
Para tentar controlar a situação, a Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos de São Paulo) determinou à Sabesp duas ações imediatas para diminuir a vazão do volume do sistema Cantareira. A primeira foi a redução da pressão nos canos por oito horas no período noturno. Depois, a redução do volume retirado do reservatório, de 31 m³/s para 27 m³/s.
Além disso, a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) e a Sabesp iniciaram campanhas para conscientizar a população quanto ao uso consciente da água e evitar desperdício.
Em nota à Folha, a Semil (Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística) do estado destaca que o novo contrato de concessão da Sabesp prevê uma série de obras de resiliência que ampliam a oferta de água, como a ampliação da estação de tratamento de água do Rio Grande, entregue este ano, com investimento de R$ 80 milhões, e a captação de água no rio Itapanhaú e ribeirão Sertãozinho, com investimento de R$ 200 milhões, que está em fase de pré-operação.
"O novo contrato também estabelece metas rigorosas para a redução de perdas d´água e determina investimentos obrigatórios neste sentido, como a substituição de ramais antigos, a modernização da rede e a adoção de tecnologias de monitoramento e setorização. O investimento previsto em redução de perdas gira em torno de R$ 3 bilhões/ano já no primeiro ciclo, mais que o dobro da média de investimento dos últimos dez anos", diz a nota.
Mesmo com todas essas iniciativas, a esperança de todos é que a primavera chegue no fim de setembro trazendo um volume de chuva que seja suficiente para recuperar os níveis dos mananciais. De acordo com as previsões de Guilherme Borges, meteorologista da Climatempo, e Enver Gutierrez, chefe da divisão de Previsão de Tempo e Clima do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), é possível, sim, que a precipitação esperada até o fim ano consiga diminuir o drama dos mananciais, recuperando um pouco os níveis.
"A tendência é que a chuva volte no final de setembro e fique mais dentro da normalidade das médias dos meses até o final do ano. Um mês ou outro pode ter um pouquinho mais de chuva que o outro, mas, de maneira geral, a tendência é que eles fiquem mais dentro da média", diz Borges.
No entanto, a longo prazo, a previsão não é nada boa, afirma Gutierrez. Ele cita um estudo realizado pelo Inpe em parceria com o Cptec (Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos), o Inmet e o Funceme (Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos) que considera os índices de precipitação e evaporação da água no país. No modelo que considera 48 meses (4 anos), a previsão é de tempo mais seco do que o normal em todo o estado de São Paulo.
"Em São Paulo, o registro de três meses mostra valores considerados como uma situação normal de chuva. Já o modelo para 48 meses muda completamente as tonalidades do índice, indicando patamares nas categorias de muito seco a severamente seco. Isto sinaliza uma situação bastante preocupante", diz Gutierrez.
Ele explica que essa cenário pessimista nos próximos anos se deve à previsão de que as temperaturas acima da média continuem a ocorrer nos próximos meses. E com a atmosfera mais quente, a tendência é que a umidade do ar diminua, que chova menos e que mais água seja evaporada do solo, alimentando o ciclo.
"Quanto mais seca a atmosfera, mais tenderá a extrair água armazenada nas plantas, no solo e em outras fontes de umidade (rios e lagoas). Essa tendência aumenta com o aumento da temperatura", destaca o meteorologista do Inpe.
Em relação à previsão de chuva na primavera, Guilherme Borges explica que a expectativa de precipitação dentro da média histórica ocorre porque o El Niño, que provocou as várias ondas de calor entre 2023 e 2024, chegou ao fim e agora vivemos um período de neutralidade, no qual as temperaturas dos oceanos Pacífico e Atlântico ficam dentro da média e não alteram o clima do planeta.
Ele, inclusive, diz que os atuais baixos níveis dos reservatórios de São Paulo foram resultado desse período de atuação do El Niño.
"A gente teve vários períodos de onda de calor intensificados tanto na primavera de 2023 quanto no verão de 2023/2024 e no outono de 2024, o que deixou a irregularidade da chuva muito forte. A gente chegou no inverno de 2024 com o tempo muito seco, com muitos períodos de calor. Por isso que a gente chega no inverno de 2025 com os mananciais no estado crítico na região metropolitana. Foi uma sequência de fatores climáticos que se combinaram para impactar o abastecimento", destaca Borges.
Com a mudança no padrão atmosférico que ocorre na chegada da primavera, o meteorologista acredita que a precipitação seja suficiente para deixar os mananciais da capital em um bom nível, mas recuperação mesmo só em março, no fim do verão. "A gente vê que pode ser uma recuperação lenta, porque os reservatórios estão em níveis muito baixos", enfatiza Borges.
uol